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Ensino de estratégias para aprender a aprender


Ensino de estratégias 

para aprender a aprender      

                         Pedro Virginio Pereira Neto

            Apesar de alguns historiadores da filosofia considerarem a produção intelectual de Francis Bacon pouco consistente, é unanime o reconhecimento de que sua contribuição para o desenvolvimento do método científico foi fundamental. O mesmo Bacon, em sua obra “Aforismos sobre a interpretação da natureza e o reino do homem”, chama a atenção para o fato de que o intelecto humano, apesar de poderoso, encontra seu limite muito cedo, se não se utiliza de instrumentos que lhe potencializem o alcance, assim como a força do braço humano pode ser potencializada pelo uso de uma alavanca.

“Nem a mão nua nem o intelecto, deixados a si mesmos, logram muito. Todos os efeitos se cumprem com instrumentos e recursos auxiliares, de que dependem, em igual medida, tanto o intelecto quanto as mãos.” (Col. Os Pensadores, Nova Cultural, 1999. p. 33)

            Verificamos, em nossa atividade docente, que uma parcela considerável da defasagem da aprendizagem escolar está na ausência do domínio de estratégias de estudo e pesquisa, por parte dos alunos. Em outras palavras, na ausência de método. Verificamos, com frequência, que mesmo alunos munidos de informações relevantes e sendo possuidores de conhecimentos prévios, acima da média, em relação aos conteúdos escolares que devem ser aprendidos, dependem muito do trabalho mediador do professor, ao ponto de este ter que voltar a atuar como um depositador de conhecimento no “banco” mental do aluno.
            José Carlos Libâneo:

“Com efeito, as crianças e jovens vão à escola para aprender cultura e internalizar os meios cognitivos de compreender e transformar o mundo. Para isso, é necessário pensar – estimular a capacidade de raciocínio e julgamento, melhorar a capacidade reflexiva e desenvolver as competências do pensar. (…) Estudos recentes sobre os processos do pensar e do aprender, para além da acentuação do papel ativo dos sujeitos na aprendizagem, insistem na necessidade dos sujeitos desenvolverem competências e habilidades cognitivas.”

            A ênfase  dada por Libâneo recai sobre a necessidade de desenvolver a capacidade reflexiva e as competências do pensar do estudante. O que quero enfatizar aqui, é o fato de que tais competências só se desenvolvem se o aluno agir sobre o meio e sobre seus elementos. Dito de modo simples e ligado à realidade escolar e da sala de aula: O aluno precisa aprender a ler e interpretar. Antes, precisa entender que o texto possui uma estrutura constituída de vocabulário, frases e argumentos ou blocos de ideias e, ainda, de intenções não expressas de modo direto. Ele precisa desenvolver a habilidade e o hábito de analisar o texto, dividindo-o em sua partes componentes e analisando-as. Para esta análise, são fundamentais estratégias como sublinhar passagens centrais, isolar conceitos (circulando-os, por exemplo), identificar autores, criar índices remissivos e elaborar seu próprio glossário de termos, dentre outras. Além do trabalho de  análise, eles devem desenvolver a habilidade de realizar sínteses, resumos e comentários (resenhas). Precisam ser orientados a como realizar pesquisas de aprofundamento a partir do texto base de seus estudos, fazendo pesquisas em outras fontes sobre conceitos, autores, temas e teorias identificadas dentro do texto base.
            Ao ingressar no Ensino Médio, é esperado que os estudantes já dominem muitas destas estratégias. Mas isto não é o que se verifica na prática. A maior parte deles mal sabe identificar dentro de um texto os conceitos centrais, as temáticas centrais e as periféricas. Não tem a percepção de que um texto pode ser um ponto de partida para pesquisas de aprofundamento, aplicando o princípio  da Wikipedia, onde links dentro de um texto levam a outros textos, criando uma rede de conhecimento sempre em expansão.
            Com frequência, em nossas salas de aula, partimos do pressuposto de que os estudantes já estão aptos para iniciar o estudo de certas temáticas e de que já dominam as estratégias básicas de estudo. Esta pressuposição é estabelecida muitas vezes de modo inconsciente. Outras vezes, é a  pressão para cumprir os programas de conteúdos que não permitem que se reserve um tempo para nivelar ou mesmo iniciar o aluno nestas estratégias.
            O problema decorrente desta atitude dos educadores, a de pressupor que o aluno está pronto, é o fato de que muitos destes alunos atravessam os três anos de sua formação totalmente perdidos, sem nunca desenvolver um mínimo de autodidatismo, simplesmente pelo fato de que nunca foram criteriosamente ensinados a estudar. As razões pelas quais este ensino específico não é levado a efeito, não é nossa preocupação aqui. Nosso intuito não é encontrar culpados. O que, aliás, é o que mais se busca, quando se fala em educação. Mais importante que “achar os culpados” é  traçar rumos para as ações solucionadoras.
            Evidentemente, uma mera crítica ao ensino de conteúdos não encontra, no meu entender, um fundamento suficientemente coerente com a práxis da aprendizagem humana. Raciocínio e conteúdo estão intimamente ligados. Se tivessemos, bem estruturadas, todas as ferramentas cognitivas e sem nenhum conteúdo sobre os quais elas pudessem operar, nossa mente seria como um sistema operacional de computador no qual não foram inseridos programas, nem dados para processamento. Por outro lado, se absorvessemos  o máximo de conteúdos sem o desenvolvimento devido dos processos de pensamento superior, teríamos um amontoado de coisas. Não poderíamos atribuir a estas coisas o status de informação, uma vez que dados ou coisas dispostas de certa maneira, adquirem o status de informação diante de uma mente capaz de reconhecer e interpretar tal disposição de dados ou de coisas. Na melhor hipótese teríamos um processador de informações que realiza operações muito limitadas, independentemente do volume de informações nele lançado. É isto que ocorre com um número significativo de nossos alunos do ensino médio. São bancos de informação.
            A conclusão a que chegamos é que estimular, antes de tudo, o autodiadtismo dos estudantes,  criando situações que lhe permitam perceber os caminhos da própria construção do conhecimento, a  beneficiar-se de um método sistemático de estudo ativo, é mais importante que lhes oferecer grandes volumes de informação pré-formatada sobre os quais eles não terão a oportunidade de exercer análise crítica. Imagino a mente do estudante como sendo feita de matéria plástica, elástica, capaz de moldar-se às exigências da complexidade do conhecimento a ser apreendido, e não como caixas de cimento e concreto, que não se moldam, não podem ser enlarguecidas, nem remodeladas.



FONTES BIBLIOGRÁFICAS:

BACON, Francis. Novo organum: Aforismos sobre a interpretação da natureza e o reino do homem.  Col. Os pensadores. Nova cultura: São Paulo,1999.

LIBÂNEO, José Carlos. A didática e a aprendizagem do pensar e do aprender: a Teoria Histórico-cultural da Atividade e a contribuição de Vasili Davydov. Artigo científico: Universidade Católica de Goiás. <http://www.google.com.br/url q=http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a01.
pdf&sa=U&ei=zCjOVNqrFMKVNs2qhBA&ved=0CCIQFjAA&sig2=1tzYp4qeBmr.SnO6qU63FQ&usg=AFQjCNEY7VoapahSyWgSwd_pBhKFR3T8AA .(www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a01.pdf). Acesso em 01/02/2015.

VASCONCELOS, Virgílio. Estratégias para enriquecer o aprendizado.<Vilelahttp://www. possibilidades.com.br/aprendizagem/estrategias_para_ aprendizagem.asp>. Acesso em:01/02/2015.

REIS, Luir Rodrigues Martins. ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM ATIVA PARA REDUZIR O
FRACASSO ESCOLAR: PAPEL DO PSICOPEDAGOGO. (https://proerdpmdf.files.
Wordpress.com/.../aprendizagem-ativa1.pdf. <Acesso em 01/02/2015 >


SALLA, Fernanda. Estudar se aprende na escola.rEVISTA Nova Escola. <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/estudar-se-aprende-escola-648565.shtml?page=1 >Acesso em 01/02/2015.





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