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ADENTRANDO O CASTELO INTERIOR: INTROSPECÇÃO, MEDITAÇÃO E ORAÇÃO EM TEREZA DE ÁVILA


ADENTRANDO O CASTELO INTERIOR: INTROSPECÇÃO, MEDITAÇÃO E ORAÇÃO EM TEREZA DE ÁVILA

Pedro Virgínio P. Neto

"Castelo interior ou moradas" é uma obra escrita pela carmelita Tereza de Ávila no século XVI, mais precisamente no ano de 1577, na Espanha. O Elogio da loucura de Erasmo de Roterdã havia sido publicado há 66 anos (1511) e as 95 teses de Martinho Lutero há 60 anos (1517). Diferentemente de tantas outras obras de seu tempo, tendo sido escrita dentro de um convento, Castelo interior não parece demonstrar entusiasmo pelos tempos modernos e agitados do Renascimento e da revolução comercial. Tereza fala do valor do ser humano, não como sendo "a medida de todas as coisas", mas como tendo sido feito à imagem e semelhança de Deus, o qual é de fato é a medida de todas as coisas. É, portanto, um livro medieval em seu espírito. 

Conforme relatado pela própria autora, a obra foi escrita em obediência ao pedido de seus superiores. Ela se mostrou resistente, a princípio. Mas "a força da obediência costuma facilitar o que parece impossível". A obra foi escrita, por fim. 

Ela descreve ao todo sete moradas ao longo de 27 capítulos, desde a entrada do castelo, pela parte mais baixa e difícil, até chegar à morada central onde habita o Rei (Deus). 

A autora toma como eixo central de suas reflexões uma bela metáfora: Compara a Alma humana com um castelo, à semelhança de tantos que havia em sua época, esculpido em uma única pedra de cristal. No interior de tal castelo abrigam-se diversas moradas que rodeiam por todos os lados a morada central, os aposentos do Rei (Deus). 

A alma humana sendo infinitamente menor que Deus é, contudo, de grande dignidade posto que foi feita imagem e semelhança de Deus. 

"Entre ele (o castelo) e Deus existe diferença que vai da criatura ao criador. Em suma, é coisa criada. Mas basta sua majestade afirmar que a fez à sua imagem, para termos uma longínqua ideia da grande dignidade e beleza da alma" (p.20)

Para Tereza De Ávila é na alma que devemos encontrar a Deus, o rei que habita na morada central. Sendo a oração a porta através da qual adentramos o castelo e seus aposentos. 

A oração, por sua vez, não pode prescindir da reflexão; da consideração sobre quem somos nós, quem é Deus e o sentido das palavras que a ele dirigimos. Nesse processo, aliado ao estudo de questões espirituais, vamos adentrando o castelo (nossa alma) desde a primeira morada, vencendo os obstáculos que são muitos a princípio.

Tais obstáculos são como feras, escorpiões  e insetos que rodeiam as muralhas do castelo e combatem aqueles que nele desejam entrar. Os cuidados do mundo, os negócios, os agitos e os espetáculos são as principais forças de atração a combater o ser humano em sua tentativa de adentrar na própria alma e alí prosseguir de morada em morada até encontrar-se com o rei e unir-se a ele num casamento místico. 

É um caminho no qual a "aridez" espiritual muitas vezes será sentida. Contudo, o esforço é recompensado, pois em nenhum outro lugar, senão "em nossa própria casa" encontraremos a verdadeira paz: No recolhimento de nossa alma em oração. 

O grande objetivo da oração é conformar-se à vontade de Deus, assevera Tereza De Ávila - Conhecida também como Tereza de Jesus. Vontade esta que vai sendo discernida na medida em que cresce o conhecimento de si próprio e a sensibilidade para ouvir os chamados de Deus que vêm das mais diversas direções. 

"Castelo interior ou moradas" é uma leitura para a formação do espírito. Seu texto e ideias têm a capacidade de nos elevar acima do espírito agitado de nossa própria época, nos dando a possibilidade de olhar "de fora" para ela. É uma espécie de alento, no calor do combate. 












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