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O ESQUECIMENTO DE SI. O SEQUESTRO DA SUBJETIVIDADE


O ESQUECIMENTO DE SI. O SEQUESTRO DA SUBJETIVIDADE

Reflexão a partir do livro: “Quem me roubou de mim?” 
do Padre Fábio de Melo

Pedro Virgínio P. Neto

Em "Quem me roubou de mim?", o padre Fábio de Melo discorre sobre o fenômeno da perda da individualidade, que ele denomina de "sequestro da subjetividade", a qual ocorre, geralmente, no âmbito dos relacionamentos interpessoais.

A subjetividade é todo o conjunto de elementos constituintes da pessoa/personalidade humana, como crenças, valores, expectativas e ideais. Retiremos de dentro de uma pessoa humana todos esses elementos e a teremos transformado em um vegetal. Sufoquemos a manifestação dessa vida interior e estaremos cometendo um "sequestro de subjetividade".

Tendo sido criado como Pessoa, O ser humano recebe, como dom de Deus, a liberdade. Primeiro, como "Potencial". Depois, como conquista do próprio ser humano, na atualização dessa potência na interação com o mundo e em seu conseqüente amadurecimento. É, pois, a liberdade, elemento fundante da personalidade humana . Para uma pessoa, ser livre é "dispor de si mesma" e, ao reconhecer sua própria identidade, viver de modo alinhado com o seu ser interior e não segundo os ideais que outros para ela tenham projetado, nos quais de fato não acredita.

Tal como ocorre com o "sequestro do corpo", em que o indivíduo é levado para um local estranho, distante de tudo o que para ele possa representar um reconhecimento e uma chance de fuga, no sequestro da subjetividade a pessoa vai sendo pouco a pouco afastada de seus referenciais de vida e de identidade (seus gostos, seus sonhos, seus amigos, seus parentes mais próximos). Aos poucos seu "horizonte de significado" vai ficando mais diminuto. Até o ponto em que, muitas vezes, todo o sentido da vida está reduzido a servir às expectativas de outros (os sequestradores). Neste momento, a pessoa vê-se atingida no fundamento mais essencial do que é ser pessoa: O exercício da própria vontade. A "disposição de si".

No processo de "despersonalização", várias são as condições e fatores contribuintes para que a pessoa desça até o lugar mais profundo do esquecimento de si mesma. Dentre eles, a imaturidade e a fragilidade afetiva merecem destaque, pois alimentam no interior da pessoa um agudo estado de carência, que não permite que ela distinga entre uma relação de amor e uma relação de posse; o medo da perca, da mudança, e a baixa crença em seu próprio valor como pessoa, são também parte do lastro que sustenta a condição de vítima, que é o ápice do processo de sequestro.

Mas qual o caminho de retorno? Assim como a descida ao fundo do esquecimento de si mesma não se dá de modo abrupto, mas gradual. A saída também não se dá de modo instantâneo. Evidentemente, não há fórmula. O autor não apresenta nenhuma dica simples e prática. Ao contrário, ele encerra com mais uma enxurrada de perguntas direcionadas para um processo de reflexão sobre a própria vida que vivemos e nossos relacionamentos. Para descobrirmos onde estamos sendo "vítimas do sequestro" e onde estamos sendo "sequestradores". Uma profunda reflexão é, portanto, pelo menos o começo do longo caminho de volta.

Talvez possa ainda, por minha própria conta e risco, acrescentar que depois da reflexão, a retomada dos pequenos projetos e sua realização, irá produzindo uma gradual confiança no valor de si mesma como pessoa, posto que tornará a ver a vida como um caminho de realização das potências de sua personalidade no encontro com outras personalidades, no âmbito de relacionamentos saudáveis.








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