Onde está Deus? Morto ou
eclipsado?
Pedro Virgínio Neto
Um dos
momentos mais significativos da história da filosofia, que alguns entendem como
o ponto mais alto, enquanto outros o vêem de perspectiva oposta, é aquele em
que Nietzsche
declara: “Deus está morto”.
Por outro
lado, Martin
Buberr, filósofo austríaco, naturalizado Israelita, veio a afirmar,
na obra o eclipse de Deus, que Deus não está morto, mas, tão somente, eclipsado
e, portanto, oculto aos olhos de uma grande parte dos homens do século XX ( e agora, XXI). Tal
como um eclipse solar em que a lua, por alguns instantes, se interpõe entre ele
e a terra ocultando-o de nossa visão. Assim, certo estado de coisas na
sociedade atual se interpõe entre nossos olhos e Deus.
Isto me
leva a pensar numa das mais belas passagens do novo testamento (Atos 17) em que outro
judeu, Ravi Shaul ou, como é mais conhecido no universo cristão, Saulo de Tarso
(o apóstolo), quando discutia na cidade de Atenas com alguns filósofos locais,
afirmou com grande veemência a transcendência
de Deus e, ao mesmo tempo, a sua proximidade em relação aos homens.
Tão
distante pela sua natureza transcendente, e tão perto pela sua presença imanente em toda a criação.
Tão perto que se o ser humano tão somente “saísse tateando”, como a dona de
casa que tateia no meio da escuridão, tentando encontrar um fósforo ou uma
vela, o acharia.
Tão
transcendente que não poderia, literalmente, habitar em templos feitos por mãos
humanas. Nem ser realmente servido por mãos humanas, em função de alguma
necessidade sua. Mas tão perto a ponto de afirmar que “nele vivemos, nos movemos e existimos”.
Estaria,
pois, Deus morto? De acordo com o entendimento de Ravi Shaul (Paulo, o
apóstolo), a morte de Deus literalmente significaria a morte da própria
existência.
Estaria
Deus eclipsado? Está, certamente, oculto aos olhos físicos do ser humano, mas
não aos olhos do seu entendimento, da sua razão. Se tão somente
perguntarmos “Porque alguma coisa existe, e não nada?”, como o fez Leibniz,
ou “Porque existo eu?”, olhando-se no espelho, seremos quase que arrastados à
visão do Criador.
Como
disse Edith Stein, outra
personalidade judaica, que foi do judaísmo ao ateísmo e, daí, ao cristianismo,
convertendo-se ao catolicismo Romano:
Aquele que busca a verdade busca a Deus,Ainda que não o saiba.
Este é o
Deus dos filósofos, encontrado pela via da razão.
Mas, para
muitos, a descoberta de Deus se dá de modo muito mais pessoal. Um verdadeiro
encontro, como bem expressou Martin Buberr. O encontro com “O Deus de Abraão, Isaque e Jacó… O Deus de teus pais”.
Não raro,
tal encontro se dá em momentos críticos de decisão, de dor, de angústia, de
partida ou de dúvidas profundas sobre a vida, onde a navalha fria da razão
está sem brilho e tudo o que ecoa em nosso peito são as demandas profundas da
existência, como no poema que se segue, de autor desconhecido:
ORAÇÃO SEM NOME
O autor desse poema, quem o sabe? Foi encontrado em
pleno campo de batalha, no bolso de um soldado americano desconhecido; do rapaz
estraçalhado por uma granada, restava apenas intacta esta folha de papel.
Escuta, Deus:
Jamais falei contigo.
Hoje quero saudar-te. Bom dia! Como vais?
Sabes? Disseram-me que tu não existes,
E eu, tolo, acreditei que era verdade.
Nunca havia
reparado a tua obra.
Ontem à noite,
da trincheira rasgada por granadas,
vi teu céu
estrelado
E compreendi
então que me enganaram.
Não sei se
apertarás a minha mão.
Vou te explicar
e hás de compreender.
É engraçado:
neste inferno hediondo
Achei a luz para
enxergar o teu rosto.
Dito isto, já
não tenho muita coisa a te contar:
Só que… que…
tenho muito prazer em conhecer-te.
Faremos um
ataque à meia-noite.
Não sinto medo.
Deus, sei que tu
velas…
Há! É o clarim!
Bom Deus, devo ir embora.
Gostei de ti…
vou ter saudade… Quero dizer:
Será cruenta a
luta, bem o sabes,
E esta noite
pode ser que eu vá bater-te à porta!
Muito amigos não
fomos, é verdade.
Mas… sim, estou
chorando!
Vês, Deus, penso
que já não sou tão mau.
Bem, Deus, tenho
de ir.
Sorte é coisa
bem rara.
Juro, porém: já
não receio a morte.
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